O espelho de Narciso

terça-feira, 17 de maio de 2005

Dar valor

A casa está vazia... As luzes semeadas pela casa, o pássaro à solta e a televisão ligada têm um único intuito: dar a ilusão de vida a esta casa vazia. Enquanto isso, o meu quarto é o santuário onde se trabalha, se conversa e se mantém o Messenger ligado para o caso da solidão apertar. E dou por mim a pensar...
É bom ter a casa vazia à nossa inteira disposição. Não precisar refilar com os jogos de futebol que estão sempre a dar na maldita televisão, jantar às horas que se quer e como se quer, poder ter a música um pouco mais alta que o habitual... Ter espaço para respirar, para gerir o nosso tempo ao nosso próprio ritmo.
Mas depois a casa vazia começa a devorar este tempo e esse espaço... E aí apetece ter companhia para fazer o jantar e pôr a mesa, alguém com quem conversar, o pai para refilar por causa da maldita televisão, a mãe para dar o beijo de boa noite, simplesmente outros para preencher o nunca acabar de divisões que esta casa vazia parece ter.
É nestas alturas que aprendemos o valor que têm as outras pessoas na nossa vida, o quanto vale o conforto de partilhar uma casa, uma rotina, uma vida, o quanto precisamos não só do nosso canto sossegado e das horas connosco próprios mas também aqueles momentos em que deixamos alguém entrar no nosso santuário ou roubamos tempo de estudo e trabalho para estar um pouco mais na sala com a família. E é nestes momentos que penso que, no que depender de mim, nunca viverei só (ou que não o farei durante muito tempo). Não importa com quem viva, pais, companheiro de casa, amigo, namorado, marido, família uniparental, filho adoptivo... apenas alguém para encher o vazio da casa com murmúrios, conversas, gargalhadas, resmunguices... amor! Porque, quando se partilha uma casa, partilha-se um rol de vivências que nos ligam aos outros de um modo especial... e isso é algo que temos de dar valor!