O espelho de Narciso

sábado, 4 de dezembro de 2004

Partir

Hoje cheguei cedo a casa! Mas cheguei com aquela sensação incómoda de ter deixado algo por metade...
O jantar-surpresa do Francisco começou bastante tarde e eu tinha de vir embora cedo. Quando saí do restaurante, havia ainda gente à espera de ser servida. Foi uma sensação muito estranha, parecia que algo me puxava para o meu lugar, me travava o movimento... Talvez por isso tenha levado tempo a despedir-me, como que a tomar coragem; talvez por isso tenha virado costas rapidamente e afastado no meu passo rápido, sem olhar para trás, como quem tomou a decisão e não pode deixar que nada a mude.
Assim sou eu ao partir... relutante, sempre esperando que me digam “não vás”, sempre a adiar o inadiável. Há momentos que não quero perder ou que não quero que acabem, há uma urgência em mim em absorver cada experiência até ao meu limite. Mas há também um mundo à minha volta, que me dita as regras da minha possibilidade de absorção: os compromissos, os horários, a família, os outros... E é nesse equilíbrio que me tento manter, quando respiro fundo e tomo coragem, quando afrouxo o abraço de despedida, quando deixo de lutar mentalmente contra o avanço do carro ou do passo. E o inevitável acontece! Tenho de partir, o tempo está esgotado. E parto, depressa e sem olhar para trás para não dar espaço a mudanças de ideias, levando apenas comigo a certeza de que queria ficar e as recordações...